O populismo, historicamente, é fator de despolitização de uma sociedade, qualquer sociedade. Investe no culto à personalidade, colocando-a acima dos temas e desafios – e mesmo dos padrões morais mais elementares -, alçando-a à categoria de semideus.
Ainda que possa ocorrer em regimes formalmente democráticos, o populismo tem viés autoritário, uma vez que se expressa por meio de um líder que se sobrepõe às instituições e fala diretamente ao povo. A Venezuela se apresenta como um regime democrático – e assim o diz o texto de sua Constituição – mas, como o demonstram os fatos objetivos, não o é.
Frequentemente, as instituições são atropeladas pela fala do líder, Hugo Chávez, que se posiciona como “pai” da população. Nessa condição, censura a imprensa, prende adversários, silencia a oposição. Getúlio Vargas era “o pai dos pobres”. Idem, Juan Domingo Perón. Idem Mussolini, Hitler e tantos mais.
Eram pais da população e as críticas a eles dirigidas vistas como afronta à família nacional.
Outro ponto característico: o populismo divide o país. É hostil à sua parcela mais politizada, demonizada no discurso oficial como opressora da porção despolitizada. É fácil entender: quanto mais politizada população, mais infensa ao populismo.
O PT, ao se constituir, nos anos 80 do século passado, era crítico ferrenho do populismo. Lula recusou diversas vezes uma maior aproximação com Brizola por considerá-lo populista, herdeiro do varguismo, incompatível com o sindicalismo moderno que então expressava. Esse, aliás, foi um fator que o projetou como a grande novidade política do país.
No poder, porém, não resistiu à sedução da popularidade. Investiu na estratégia populista e divisionista e chega agora ao paroxismo do processo: apresenta-se como o “pai” do povo, a quem transmitirá como legado “uma mãe”, sua candidata à Presidência, Dilma Roussef. A eficácia eleitoral mede-se nas pesquisas, mas os prejuízos políticos são imensuráveis.
Despolitiza a campanha, reduzindo-a a mera disputa por fragmentos do prestígio do presidente, transformado em orixá pela máquina de propaganda oficial. Os temas essenciais são postos de lado ou vagamente tangenciados. As alianças estaduais são relativizadas e os paradigmas programáticos simplesmente inexistem. O resultado é a desorganização do quadro político-partidário. Desorganização da política, caminho mais fácil para o autoritarismo.
Diante de uma plateia de trabalhadores rurais, a candidata do PT põe o boné do MST e condena a criminalização dos movimentos sociais. Já quando a plateia é de produtores rurais, diz o contrário: condena as invasões de terras e diz que não permitirá que a lei seja descumprida. Jura fidelidade à liberdade de imprensa e rubrica um programa de governo que institui o “controle social da mídia” e institui instâncias de punição.
As incongruências não precisam ser explicadas. Basta dizer que tem o apoio de Lula e que Lula tem o apoio de mais de 70% da população. A política torna-se instância estatística, sem compromissos com outros valores. É um filme antigo, que já se supunha fora de cartaz, mas cujo final não costuma ser feliz.
Ruy Fabiano é jornalista
sábado, 21 de agosto de 2010
sexta-feira, 6 de agosto de 2010
Abre as asas sobre nós
Deve-se, então, limitar a liberdade do indivíduo para que ele não se torne nocivo aos demais.
(John Stuart Mill, “A liberdade”)
O humorista está proibido de satirizar os políticos; os pais estão proibidos de dar palmadas nos filhos; os torcedores de futebol estão proibidos de brigar a menos de 5 km. dos estádios; os políticos de ficha suja estão proibidos de se candidatar a cargos eletivos; as pessoas estão proibidas de fumar em recintos públicos; não se pode beber e dirigir.
Alguém pode ser contra medidas tão morais, tão higiênicas, saudáveis e anti-discriminatórias?
A questão, na verdade, não é essa. A questão é a que o psicanalista Contardo Calligaris colocou cirurgicamente na sua coluna na “Folha de S.Paulo” desta semana, num artigo sobre a lei da palmada: “Pergunta: para que servem leis que pouco mudam o quadro legal e só explicitam e particularizam proibições que já vigem de modo geral”?
Esse é o problema da excessiva intromissão do Estado na vida dos cidadãos : ele entra em minudências coercitivas da vida particular das pessoas e reitera que é delito aquilo que já era assim definido em outras leis. Ou seja: não há novos delitos, há novas leis, novos regulamentos, novas proibições, inclusive do que já era proibido.Ou antes da existência da Lei da Ficha Limpa o político podia fraudar ou roubar ? Ou antes do Estatuto do Torcedor as torcidas organizadas podiam se massacrar longe, perto ou dentro do estádio ? Ou os bêbados podiam atropelar e matar as pessoas? Ou os pais podiam espancar seus filhos ? Ao criminalizar cada vez mais minuciosamente as transgressões,duplicando ou triplicando a sua tipificação, o Estado faz com que aumente a sensação geral de impunidade.Quanto mais crimes a punir, menos crimes punidos.
Por conveniências políticas, as leis,os regulamentos,os estatutos,as normas, são feitos a toque de caixa, acabam se sobrepondo a leis maiores, às vezes até conflitam com elas, e criam um emaranhado legal cheio de contradições , fissuras, inconsistências e ambiguidades por onde advogados ladinos podem transitar com facilidade e aliviar a vida de seus clientes.
Quanto tempo vai demorar,por exemplo, para que a sociedade se desencante com a Lei da Ficha Limpa? Os legisladores correram para redigi-la e aprová-la a tempo de aplacar o clamor popular que exigia urgência para a medida moralizadora, e na pressa entregaram uma lei com tantas ressalvas,tantos buracos e tão confusa que dificilmente escapará de muitas contestações e alguma declaração de inconstitucionalidade.
Quando Garotinhos, Barbalhos, Malufs e Rorizes começarem a escapar pelos buracos abertos na malha da lei e aparecerem lépidos e fagueiros nas urnas eletrônicas, e depois nas cerimônias de diplomação, todas as boas almas que pressionaram o Congresso irão se juntar às legiões de desencantados que já acham que este País não tem jeito.E a sensação de impunidade ficará mais pesada e difícil de carregar.
Não precisamos de tantas leis e nem de tanta interferência do Estado na nossa vida.Nao precisamos de tutela, precisamos de eficiência.Se as leis que já existem fossem cumpridas , o País seria outro.
Sandro Vaia é jornalista. Foi repórter, redator e editor do Jornal da Tarde, diretor de Redação da revista Afinal, diretor de Informação da Agência Estado e diretor de Redação de “O Estado de S.Paulo”. É autor do livro “A Ilha Roubada”, (editora Barcarolla) sobre a blogueira cubana Yoani Sanchez.
e.mail: svaia@uol.com.br
(John Stuart Mill, “A liberdade”)
O humorista está proibido de satirizar os políticos; os pais estão proibidos de dar palmadas nos filhos; os torcedores de futebol estão proibidos de brigar a menos de 5 km. dos estádios; os políticos de ficha suja estão proibidos de se candidatar a cargos eletivos; as pessoas estão proibidas de fumar em recintos públicos; não se pode beber e dirigir.
Alguém pode ser contra medidas tão morais, tão higiênicas, saudáveis e anti-discriminatórias?
A questão, na verdade, não é essa. A questão é a que o psicanalista Contardo Calligaris colocou cirurgicamente na sua coluna na “Folha de S.Paulo” desta semana, num artigo sobre a lei da palmada: “Pergunta: para que servem leis que pouco mudam o quadro legal e só explicitam e particularizam proibições que já vigem de modo geral”?
Esse é o problema da excessiva intromissão do Estado na vida dos cidadãos : ele entra em minudências coercitivas da vida particular das pessoas e reitera que é delito aquilo que já era assim definido em outras leis. Ou seja: não há novos delitos, há novas leis, novos regulamentos, novas proibições, inclusive do que já era proibido.Ou antes da existência da Lei da Ficha Limpa o político podia fraudar ou roubar ? Ou antes do Estatuto do Torcedor as torcidas organizadas podiam se massacrar longe, perto ou dentro do estádio ? Ou os bêbados podiam atropelar e matar as pessoas? Ou os pais podiam espancar seus filhos ? Ao criminalizar cada vez mais minuciosamente as transgressões,duplicando ou triplicando a sua tipificação, o Estado faz com que aumente a sensação geral de impunidade.Quanto mais crimes a punir, menos crimes punidos.
Por conveniências políticas, as leis,os regulamentos,os estatutos,as normas, são feitos a toque de caixa, acabam se sobrepondo a leis maiores, às vezes até conflitam com elas, e criam um emaranhado legal cheio de contradições , fissuras, inconsistências e ambiguidades por onde advogados ladinos podem transitar com facilidade e aliviar a vida de seus clientes.
Quanto tempo vai demorar,por exemplo, para que a sociedade se desencante com a Lei da Ficha Limpa? Os legisladores correram para redigi-la e aprová-la a tempo de aplacar o clamor popular que exigia urgência para a medida moralizadora, e na pressa entregaram uma lei com tantas ressalvas,tantos buracos e tão confusa que dificilmente escapará de muitas contestações e alguma declaração de inconstitucionalidade.
Quando Garotinhos, Barbalhos, Malufs e Rorizes começarem a escapar pelos buracos abertos na malha da lei e aparecerem lépidos e fagueiros nas urnas eletrônicas, e depois nas cerimônias de diplomação, todas as boas almas que pressionaram o Congresso irão se juntar às legiões de desencantados que já acham que este País não tem jeito.E a sensação de impunidade ficará mais pesada e difícil de carregar.
Não precisamos de tantas leis e nem de tanta interferência do Estado na nossa vida.Nao precisamos de tutela, precisamos de eficiência.Se as leis que já existem fossem cumpridas , o País seria outro.
Sandro Vaia é jornalista. Foi repórter, redator e editor do Jornal da Tarde, diretor de Redação da revista Afinal, diretor de Informação da Agência Estado e diretor de Redação de “O Estado de S.Paulo”. É autor do livro “A Ilha Roubada”, (editora Barcarolla) sobre a blogueira cubana Yoani Sanchez.
e.mail: svaia@uol.com.br
domingo, 1 de agosto de 2010
Frase do Dia
Acho um governo nefasto (o governo Lula). Porque cooptou e paralisou o movimento popular. Cooptou as lideranças, transformou os movimentos em ONGs, terceirizou uma série de serviços que são do Estado como forma de transpassar dinheiro para as entidades.
”
Plínio de Arruda Sampaio, candidato do PSOL a presidente da República
”
Plínio de Arruda Sampaio, candidato do PSOL a presidente da República
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